sexta-feira, 30 de outubro de 2009
de quem tem medo, o medo passa com o vento;
Ainda estavam suados, ofegantes, como sempre na mesma situação. Deitados um do lado do outro, talvez por cima, um tanto quanto. Se olhavam, em silêncio. No olhar, a quietude dos amantes, sempre a espera de um vestígio de barulho, aquela que diz tantas coisas, tantas coisas, sem ser preciso dizer nada. As bocas entreabertas, tão próximas, suplicantes por mais beijos, soltavam a respiração alta, entrecortada, impossível não se ouvir. Ela, tão frágil, desnuda. Sem a maquiagem e as roupas. Sem ter algo com o que se esconder diante daquela figura imponente, forte, que a queria tanto, independente de nada e nem ninguém, naquele momento eu só o que queria, a queria. Ah, sim, ela era mulher, sentia-se assim: mulher. Os cabelos lisos descendo pelos seios belos, simetricamente perfeitos, dos bicos minúsculos e rosados. Era tão cheia de detalhes. Detalhes esses tão conhecidos por quem está ao seu lado. Pois que era mesmo. Aquele corpo ofegante perto do seu era velho conhecido. Os dois amantes já não encontravam mais tantas surpresas ao se amarem, uma vez que tudo o que havia de novo foi desvendado. Ela, que tbm conhecia cada detalhe do corpo, podia citar de olhos fechados todas as marcas adquiridas de um tempo pra cá, cada mínima parte era sua, pertencia-lhe. E mesmo assim, desejava-o tanto, na sua ânsia, que precisava possuir. Queria tanto aquele corpo, meu Deus! E de tanto querer, envergonhou-se. O rubor ligeiro passou-lhe pela face, suada, o coração palpitante acelerou-se e os poros permitiam que o suor saísse mais depressa. “ que vergonha”, pensava. Vergonha de desejar tanto algo que já era seu por tanto tempo. Vergonha, no final, de ter mostrado toda a sua imperfeição, toda a sua parte humana. E então, num gesto impulsivo, daqueles que a gente só percebe depois que já fez, colocou o rosto entre suas mãos, apertando como se aperta um passarinho que não se quer deixar escapar. E beijou-lhe a boca úmida, com um fulgor que já não lhe pertencia mais, e sim à mulher que despertara dentro dela. A alegria, por ter sido tão completamente apaixonada por quem se beijava. E também, no fundo sabia, vergonha por estar ali, como se fosse um erro imperdoável e ela fosse a culpada por ter deixado acontecer. Intenso, apenas afagou-lhe os cabelos e, olhando os olhos cúmplices da mulher, disse: - eu te amo. E sem querer ouviu de volta que também era amada e mais "Você é a criatura mais perfeita que já me apareceu na vida." E ela, cheia das imperfeições, cheia do pecado de desejar tanto e de deixar o tempo passar, tornara-se, aos olhos de quem a acompanhava, perfeita.
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